A escrita rendilhada

Outro dia, ao ter de falar dela, creio que lhe referi a escrita «rendilhada». Hoje já ninguém sabe o que isso é, fio a fio, a agulha de ponta romba, os olhos a mirrarem-se, de laçada em laçada. Quando eu era miúdo, havia pela casa toalhas de fartas mesa, naperons para frágeis bibelots, colchas para púdicas camas, guardanapos mesmo para bocas limpas, que eram vidas perdidas a dedilhar, os dedos moídos, as costas cansadas, o candeeiro em quebra-luz ao entardecer. O supremo refinamento era descobrir nesses labirintos de Ariana, o direito do avesso. Hoje, o mofo, a traça, o esquecimento, tornou tudo isso um tempo de inutilidade desfiada.