Não sei qual a razão mas fantasiei que nunca terá encontrado quem amar. E li todos os seus livros em busca de uma pálida menção que fosse que me desse qualquer pegada dessa sua travessia pelas terras dos sentimentos e encontrei neles todos os amores possíveis por todas as possibilidades amorosas menos aquela que corre o grave risco de passar por ser o amor convencional: o amor que decorre da lei da atracção universal não dos corpos celestes mas dos corpos humanos, espécie de Lei de Newton da gravitação pela qual as almas se equilibram nas elípticas das suas órbitas sensitivas.
Tinha lido afinal tudo mal porque lera tudo distraidamente. Sei que se escrevem já teses de doutoramento sobre a sua escrita, haverá quem tudo leia por querer descortinar pela escrita a sua técnica de vida, como se viver fosse um método e contar o vivido um meio.
Esta noite, porém, abri ao acaso o Estátua de Sal e encontrei-o aquele homem «que não pertencia ao mundo dos mais». Era russo, fumava cachimbo e foi em Hong-Kong, o homem que tinha «os olhos de oiro», o homem que porventura não existiu.
«Não sei se bom se foi mau o nosso amor. sei que foi belo», diz Maria Ondina. «Quantas vezes nos teríamos encontrado? Se penso bem, afigura-se-me tudo um tempo só». Um breve instante, em cada momento a totalidade do tempo.